Eros ex machina

Eros ex machina

Luiz Bras (organização)
Editora @link
152 páginas
Lançado em 2018

No passado, a ficção científica era o espaço para a humanidade sonhar com uma utopia diante dos enormes saltos tecnológicos desde a revolução industrial ou temer um futuro criado por uma humanidade que pela primeira vez na história tem a capacidade de aniquilar a sua própria existência.

A maioria das previsões não se concretizou, pois não eram profecias, mas sim espelhos de uma sociedade pós-guerra assombrada por governos totalitários e bombas nucleares. Então qual é o futuro imaginado pela geração que cresceu nesse distante século 21 sonhado nos clássicos do passado?

Se depender da coletânea Eros ex machina, lançada em fevereiro, os nossos medos e esperanças não estão mais nos foguetes, mas sim debaixo do lençol. E eles podem ser ainda mais assustadores do que uma bomba nuclear.

São dezoito contos escritos pelos participantes do ateliê Escrevendo o Futuro, cada qual uma reflexão sobre como será o sexo na era dos robôs. O tema ganha na maioria das histórias um ar quase freudiano, com o sexo refletindo as fobias de uma geração que enfrenta todos os dias o dilema da desumanização diante da tecnologia e pautas como o feminismo e a ampliação dos direitos LGBT, além do crescimento da resistência diante dessas bandeiras.

Um exemplo desse lado negro do sexo está em VeriDIANA, de Alex Xavier, a história de uma criança que descobre da pior forma possível o que é sexo, pelo menos na cabeça do seu pai. Já em Ela é tão bonita desligada, de Nathalie Lourenço, é discutido o quanto dos outros ainda existe em nós após o fim de um relacionamento (seja ele carnal ou de silicone).

Nem todas as histórias são sobre relações físicas. Delete, de Nathan Elias-Elias, por exemplo, revela um mundo em que os aplicativos mostram mais interesse e compreensão no outro do que o distante e preconceituoso mundo real. Há também espaço para tons mais leves, como Vaaaiii, Coriiinthians!, em que Sonia Nabarrete narra de forma cômica a homofobia no futebol, usando como personagem um robô que acaba apaixonado pelo esporte em um momento inesperado.

Diante dessa distopia psicológica, cabe a Luiz Bras, orientador do ateliê, encerrar a coletânea com o conto Sob a cúpula. Nele, a ficção científica ganha um tom mítico e místico, sobre uma comunidade que usa a tecnologia para transformar o sexo não em um ato de hierarquização, mas sim de união social. Ali, não importa o seu gênero ou qualquer outra orientação sexual usada para segregar a sociedade, há apenas uma comunhão em uníssono de uma tribo em busca do prazer não individual, mas coletivo.

É possível interpretar essa conclusão da coletânea como uma última lição de Luiz aos seus alunos. Assim como não entramos no novo século sob as chamas das bombas nucleares temidas no passado, é possível que os nossos netos não vivam em um mundo em que o sexo seja apenas o reflexo dos impulsos mais sombrios da humanidade. Imaginar esse futuro não é apenas esperá-lo, mas sim tentar realizá-lo.

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Evandro Furoni é jornalista e colabora com a revista Galileu e outras publicações culturais.

[ Resenha publicada originalmente na revista Galileu. ]